Helena Roseta
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Helena Roseta:
“Isto é o futuro. Não podemos só atirar dinheiro para cima das pessoas”
Entrevista de Pedro Rainho para a Visão
26-06-2020
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São 10 milhões de euros por ano para financiar projetos até 50 mil euros e que vão ajudar a “dar poder às pessoas nos bairros mais pobres”. A arquiteta, ex-deputada e ex-presidente da Assembleia Municipal de Lisboa, vai ser o rosto do programa “Bairros Saudáveis.”
O nome tem conotação “positiva” e isso não acontece por acaso. “Não é preciso fazer nenhuma lista negra. Quem não quer viver num bairro saudável?”, pergunta Helena Roseta. A arquiteta vai liderar um programa do Governo que contará com 10 milhões de euros, todos os anos (este ano serão apenas três milhões), para financiar projetos comunitários apresentados pelas pessoas dos bairros para melhorar a vida do sítio onde moram. “Há um palavrão, que não se diz em português, mas que resume bem a ideia: queremos «empoderar» as pessoas”, explica à VISÃO a ex-deputada eleita pelas listas do PS.

As regras de funcionamento são relativamente simples. Um grupo de pessoas, uma associação, uma organização da comunidade, o centro de saúde da freguesia – a escolha de parceiros é livre – juntam-se e definem um projeto de intervenção local. As candidaturas têm de ser sempre feitas em parceria e integrar uma entidade coletiva, porque essa é a única forma de poderem receber as verbas do Governo central que depois vão aplicar no seu projeto.

Esses parceiros apresentam a ideia a um júri independente da equipa responsável pelo programa – “ainda não posso revelar nomes mas já tenho umas ideias”, diz Roseta. Esse júri avalia, então, a proposta e atribui-lhe uma pontuação (os critérios de avaliação vão ser divulgados em resolução do Governo). A iniciativa é renovada todos os anos e não tem, à partida, data para ser encerrada.

A criatividade de cada grupo é o limite. Helena Roseta dá os exemplos (1) da Graça, onde 100 famílias divididas em duas torres se juntaram para instalar alarmes de incêndios nos prédios onde viviam. “Se não fosse aquele sistema, arriscavam-se a morrer ali todos caso houvesse um fogo”, explica. Noutro caso, nas Olaias, um grupo de moradores e associações de uma zona carenciada propuseram a construção de uma pista de skate. “Aquele projeto reabilitou a vida do bairro e começaram a juntar-se ali moradores de bairros vizinhos”, recorda a antiga presidente da Assembleia Municipal de Lisboa. Ainda noutro caso, em Chelas, vários designers juntaram-se a uma organização local, foram buscar equipamentos em desuso de antigas fábricas e criaram uma oficina de arte. “Os artigos”, recorda Roseta, “acabaram por ser vendidos no Centro Cultural de Belém”.

Depois de apresentados ao júri, os projetos são divididos em três categorias, em função do valor considerado necessário para a sua execução, que pode ir até aos cinco mil, 25 mil ou 50 mil euros. Desde que a ideia é submetida ao júri até à sua concretização não deverão passar “mais de nove meses”, garante Helena Roseta, que já traz de Lisboa a experiência acumulada da liderança de um programa em tudo idêntico ao atual. O convite para as funções chegou-lhe na manhã quinta-feira, vindo do gabinete da ministra da Saúde, Marta Temido. Roseta colocou uma condição: que exercesse as funções sem qualquer vencimento.

“Temos de acreditar na energia das pessoas”, defende a arquiteta, que agora surge à frente de um programa que já conhece mas que é adaptado à realidade da pandemia. “Os determinantes de saúde potenciam” o projeto, porque envolvem questões como a habitação, o espaço público, a saúde, justifica. “As pessoas sabem aquilo de que precisam, são capazes de fazer coisa extraordinárias e são altamente proativas, têm é de ter recursos”, acrescenta ainda. “Essa é a lição da minha vida.”

(1) Os exemplos são de projectos financiados pelo Programa Bip-Zip de Lisboa